Cultura de Paz


A paz não pode ser apenas garantida pelos acordos políticos, econômicos ou militares. No fundo, ela depende do comprometimento unânime, sincero e sustentado das pessoas. Cada um de nós, independentemente da idade, do sexo, do estrato social, crença religiosa ou origem cultural é chamado à criação de um mundo pacifico.” Koïchiro Matsuur
As palavras do Diretor Geral da UNESCO, pretendem mostrar a necessidade e importância de estarmos engajados no movimento pela Paz, construindo uma Cultura que permita conjugar atitudes individuais e coletivas em prol do bem estar e do desenvolvimento humano.
Mas, o que significa Cultura da Paz?

Construir uma cultura da paz envolve dotar as crianças e os adultos de uma compreensão dos princípios e respeito pela liberdade, justiça, democracia, direitos humanos, tolerância, igualdade e solidariedade. Implica uma rejeição, individual e coletiva, da violência que tem sido parte integrante de qualquer sociedade, em seus mais variados contextos. A cultura da paz pode ser uma resposta a diversos tratados, mas tem de procurar soluções que advenham de dentro da (s) sociedade (s) e não impostas do exterior.
Cabe ressaltar que o conceito de paz pode ser abordado em seu sentido negativo, quando se traduz em um estado de não-guerra, em ausência de conflito, em passividade e permissividade, sem dinamismo próprio; em síntese, condenada a um vazio, a uma não existência palpável, difícil de se concretizar e precisar. Em sua concepção positiva, a paz não é o contrário da guerra, mas a prática da não-violência para resolver conflitos, a prática do diálogo na relação entre pessoas, a postura democrática frente à vida, que pressupõe a dinâmica da cooperação planejada e o movimento constante da instalação de justiça, respeito, empatia, solidariedade, desenvolvimento de habilidades sócio emocionais.
Uma cultura de paz implica no esforço para modificar o pensamento e a ação das pessoas no sentido de promover a paz. Falar de violência e de como ela nos assola, deixa de ser a temática principal. Não que ela vá ser esquecida ou abafada; ela pertence ao nosso dia a dia e temos consciência disto. Porém, o sentido do discurso, a ideologia que o alimenta, precisa impregná-lo de palavras e conceitos que anunciem os valores humanos que decantam a paz, que lhe proclamam e promovem. A violência já está bastante denunciada, e quanto mais falamos dela, mais lembramos sua existência em nosso meio social e ambiental. É hora de começarmos a convocar a presença da paz em nós, entre nós, entre nações, entre povos.
Um dos primeiros passos neste sentido, refere-se à gestão de conflitos. Ou seja, prevenir os conflitos potencialmente violentos e reconstruir a paz e a confiança entre pessoas emergentes de situação de guerra, é um dos exemplos mais comuns a serem considerados. Tal missão estende-se às escolas, instituições e outros locais de trabalho por todo o mundo, bem como aos parlamentos e centros de comunicação, a lares e associações.
O conflito é um processo natural e necessário em toda sociedade humana, é uma das forças motivadoras da mudança social e um elemento criativo essencial nas relações humanas
Um outro passo é tentar erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades, lutando para atingir um desenvolvimento sustentado e o respeito pelos direitos humanos, reforçando as instituições democráticas, promovendo a liberdade de expressão, preservando a diversidade cultural e o ambiente.
A cultura da paz está pautada em valores humanos que precisam ser colocados em prática, a fim de passarem do estado de intenção para o exercício da ação, transformando-se, concretamente, em atos. Tais valores, que se traduzem em éticos, morais e estéticos, nos encaminham para o despertar de expressões de amor e manifestações de respeito, que têm estado adormecidas, nos últimos tempos.
O amor, em seus diversos modos, vem sendo relegado a um segundo plano, pelas pessoas que acabam priorizando a necessidade de obter êxito em seu trabalho ou de resolver as dificuldades da vida diária. O que tem provocado, por uma lado, ignorar o próprio potencial que temos para amar, e por outro, minimizar sua importância. Mostrar, livre e sem inibição, nossa capacidade de amar, tem sido uma tarefa das mais difíceis, atualmente.
O amor é um sentimento que se caracteriza por envolver a personalidade como um todo, traduzindo-se em valorização pessoal e auto estima. Ou seja, se converte em um motor que impulsiona e regula a conduta de alguém no sentido de compelir à realização ou propor coisas que antes não eram sequer cogitadas.
Obviamente, não podemos perder de vista nosso contexto atual, pois, não há dúvida, que os processos de automação, a velocidade do cotidiano e, de um modo geral, os complexos e ameaçadores tempos que vivemos, estão latentes em nossa subjetividade e possuem um valor estressante, modificando a atitude e concepção do fenômeno amoroso. A isto se juntam velhos vícios que, ainda hoje, permeiam a educação e a orientação que os pais dão aos filhos, educando a menina e o menino com padrões psicológicos e morais totalmente diferentes. O que acaba se estendendo aos contextos escolares e funcionando como impedidores da manifestação do amor em sua versão mais simples.
O amor, entendido como um componente essencial da cultura é, não só, causador de um desfrute estético para quem o possui, como também provoca o bem estar físico, psíquico e social, transformando-se em um poderoso meio promotor de saúde e autodesenvolvimento humano.
É então no entrelaçamento paz, desenvolvimento, direitos humanos, democracia, que podemos vislumbrar a Educação para a Paz.
O princípio que inspira as ações sócio educativas parte do reconhecimento das diferenças entre pessoas e grupos. Ele vai nos dar a chave para realizar uma ação conjunta com todas as partes implicadas, para efetuar mudanças que incidam sobre a melhora da qualidade de vida. Fomentando a consciência crítica e favorecendo a transformação social, o processo educativo passa a ser responsabilidade não só das pessoas diretamente envolvidas com ele (pais e filhos, professores e alunos...), mas também da comunidade a que pertencem. Intervenção que teria como finalidade possibilitar e promover estilos de vida alternativos, que favoreceriam o crescimento pessoal, tanto individual como o coletivo, ajudando e apoiando os menores e os jovens a realizar eleições responsáveis positivas e críticas.
Pressupostos teóricos e os princípios metodológicos que regem a Cultura de Paz.
As bases que alicerçam as ações sócio educativas estão voltadas a:
Identificar formas de violência.
- Adquirir hábitos de discussão e posicionamento crítico em relação às realidades sociais passadas e atuais.
- Desenvolver o espírito de tolerância e a capacidade de diálogo.
- Construir um quadro de valores humanistas em que a solidariedade surja como suporte lógico de todos os comportamentos individuais e coletivos.
Desenvolver atitudes de solidariedade em relação ao "outro": indivíduo, povo, cultura.
- Adquirir hábitos de discussão e posicionamento crítico face a outros povos.
- Identificar situações de violação dos direitos humanos.
Identificar as "justificativas" para atentados à liberdade individual e refletir sobre as mesmas.
Contribuir para a conscientização do papel de cada um e de todos no combate às diferentes formas de discriminação.
- Identificar meios e profissionais da comunicação social que servem à defesa dos direitos dos cidadãos.
Identificar indicadores de violência
Relacionar o saber científico com as vivências sociais
Promover hábitos de pesquisa
Clarificar conceitos
A Educação para a Paz está ou, tem de estar, presente em todas as palavras, todas as atitudes, todos os momentos de todos os dias.
Como podem as ideias e os ideais ligados pela expressão "Cultura de Paz" serem transformados em políticas e ações, públicas e privadas, que mudem as vidas, onde quer que elas sejam ou estejam?
Esta pergunta, que nos inquieta a todos, pode ser respondida com sugestões a serem exercidas na prática educativa, que têm como principal argumento as informações advindas do cotidiano. Tais ações, tipicamente sócio educativas, estão pautadas na singularidade do desenvolvimento humano sustentado pela interação sujeito mundo, a qual nos permite compreender a proposta pedagógica de Paulo Freire, por um lado, e as concepções psicológicas de Vigotski, por outro, proporcionando uma interpenetração pertinente à visão transdisciplinar.
A ação educativa de alfabetizar como compreensão "da palavra e do mundo" (o texto e o contexto), por exemplo, se converte em práxis transformadora, porque, ao tomar conhecimento daquilo que o rodeia, o homem passa da esfera mecânica e passiva de apreensão da realidade para a dimensão crítica e participativa, na qual a consciência aflora como fruto do processo de ação reflexão.
A definição de Desenvolvimento Humano sugerida por Vigotski, sustentada pela interação das instâncias psicológicas, antropológicas e orgânicas, permite vislumbrar o sujeito em sua complexidade. Ademais, o conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, definido também por ele, admite como ponto de partida, acreditar que somos dotados de potencialidades que, ao serem estimuladas, favorecem o aparecimento de manifestações imprevisíveis, inesperadas, alimento de nossa criatividade.
A ação sócio educativa baseada na interlocução Freire e Vigotski, advém do diálogo acerca dos problemas das pessoas, favorecendo a que elas expressem o mundo em que vivem a partir do seu modo de concebê-lo. E, nesta interação, tomar consciência do que é vivido pelo próprio grupo e a realidade concreta do dia a dia que o cerca. Assim, a ação sócio educativa se efetiva através de dois princípios: o da realidade objetiva e o do interesse individual e coletivo. Toda ação educativa pretende alcançar um fim, um objetivo que não permite a neutralidade. Assim, os principais problemas da educação não são exclusivamente questões pedagógicas, mas também questões políticas. A educação transformadora, uma educação fundamentada nos princípios da cultura de paz, pode nos fazer sonhar uma comunicação melhor, uma justiça melhor, um mundo melhor.

                                                     Referências Bibliográficas

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FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 2006.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.

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FREIRE, Paulo, GADOTTI, Moacir e GUIMARÃES, Sergio. Pedagogia: Diálogo E Conflito. São Paulo: Cortez, 2000.

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